18 de abril de 2011

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Apresentam-me ao almoço uma vasta lista de pitéus. Lembro-me da gama de cores de um catálogo de tintas mas aqui posso deliciar-me com os aromas.
Fujo das carnes e atiro-me aos peixes.
Antes de mais levanto-me e miro a vitrina. Vejo um sargo acabado de chegar num balde de pescador, ainda a estremecer. Deixa-se de espasmos quando colocado sobre os outros.
- Quero aquele! – Aponto-o, encantada com os breves sinais de vida. É fresco e a frescura é sempre saudável.
- E o que vai desejar beber?
Peço ao empregado que me dê um tempo para pensar.
E agora? Um vinho que me embriague ou um sumo que me fortaleça? Água. Água?
Vem o peixe. Escalado e seco. Fico a olhar para aquilo, desapontada.
- Bem sabes que não podes criar expectativas!
Levanto os olhos e não vejo ninguém. Giro a cabeça à procura de quem me falou. “Mau!..”, penso, “eu não estou maluca!..”
Baixo a cabeça no sentido do prato mas com os olhos continuo buscando pelos lados, na vista periférica…
- Então, menina, já decidiu o que vai beber?
Apresso-me a dar-lhe uma resposta. Tenho que lhe dar uma resposta!
- Hum… ss-simmm…
Olha-me expectante. “Não cries expectativas” é tudo o que me vem à cabeça. “Como não crio expectativas, bolas?” Tento desviar-me destas linhas de texto, empurro-as com as mãos e inclino a cabeça para ver o homem, sorrindo-lhe.
- Pode ser… pode ser…  - e não consigo completar a frase, quanto mais o raciocínio… - “Não cries expectativas”, mas quais expectativas?
Ele continua à espera. Tento ir por partes. Não sei se beba vinho.
- Para que andas tu a beber?
- Como?
O homem olha-me em silêncio, não foi ele que me disse aquilo. Sorrio-lhe outra vez.
- A beber para te sentires pior quando não precisas de beber para te sentires bem?
- Aah… eu…
Começa a mostrar sinais de desconforto.
- Olhe, não quero nada! – sorrio-lhe de novo.
Nem responde. Abana a cabeça e vai andando na direcção da cozinha enquanto eleva a voz para dizer: “Carlos, mesa 23!"
Baixo os olhos para o peixe, morto no meu prato. Já não o quero. Ou quero?
Espeto-lhe o garfo para não dar mais nas vistas. Tiro um pedaço e levo-o à boca. Nem bom nem mau, sabe ao mesmo que os outros. Como-o.
Na mesa ao lado uma senhora pede a felicidade eterna. Trazem-lhe um prato com marido acompanhado de comprimidos. Toma-os todos com satisfação.
- I’ll have what she’s having!  - ocorre-me dizer.
Vejo o empregado avançar com um prato na minha direcção, sorrindo muito, enquanto todos se viram para mim a aplaudir, como naquelas “Flash Mob” que vejo no Facebook.
Levanto-me de repente, fazendo cair os talheres. Enfio os dedos na garganta e vomito o peixe ali mesmo, em cima do prato. Param todos e deixam de sorrir.
Largo o dinheiro que tenho em cima da mesa e desato a correr porta fora.
À noite vejo o Charlie e Lola enquanto partilho almôndegas com puré.

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